sexta-feira, 5 de maio de 2017

A Regeneração Precede a Fé?

“A maioria dos calvinistas creem que a regeneração precede a fé”, disse David Allen na Conferência João 3.16[1], nos dias 21-22 de Março, realizada na Primeira Igreja Batista Metro Norte em Atlanta/Georgia.
Allen citou Boettner, Pink, Sproul e Piper para embasar a sua declaração, mas ele citou também outros calvinistas, que mantém uma posição diferente ou são ambivalentes sobre essa questão – até mesmo o próprio Calvino em seu comentário de Efésios 2.
Muitos calvinistas baseiam suas visões da regeneração precedendo a fé sobre a visão deles da depravação total como equivalente a inabilidade total e sobre interpretações de versos, incluindo João 1.12-13; 3.1-6; Efésios 2.1-10, e.g.
“A frase ‘regeneração precede a fé’ está repleta de ambiguidade”, Allen disse, pedindo “o que se entende pelas palavras regeneração, fé e preceder, e se preceder significa preceder logicamente ou temporalmente/cronologicamente”.
Allen perguntou se a frase denota “regeneração mediata por meio da Palavra, como muitos calvinistas afirmam, ou regeneração imediata, sem utilização de meios, onde somente o Espírito age diretamente e imediatamente, como outros calvinistas afirmam. Parte dessa confusão sobre essa questão é uma falha em definir os termos cuidadosamente”, disse ele.
Depois de notar a importância de não deturpar os calvinistas em suas crenças, Allen percebeu que a maioria dos calvinistas dizem que há três coisas que devem ser distintas com repeito a regeneração antes do processo de salvação:

1) Temporal vs ordem lógica;
2) Regeneração e conversão;
3) Regeneração inicial da regeneração final;

Com respeito ao ponto 2, nós temos essa citação das notas de Allen com respeito ao que a BFM diz da Ordo Salutis:

“Notar que a BFM nem trata a regeneração antes ou depois da conversão. Mais, ela trata a regeneração e a conversão como realidades concomitantes do início da salvação. Separando a salvação em (regeneração, justificação, santificação, glorificação), artigo IV da Baptist Faith and Message trata a regeneração e a conversão como parte de um evento. Regeneração é ‘uma mudança do coração trabalhada pelo Espírito Santo por meio da convicção do pecado, para o qual o pecador responde em arrependimento em direção a Deus e fé no Senhor Jesus Cristo’. O que é antecedente ao “quê”? Mais provavelmente a ‘convicção de pecado’, é a frase mais próxima. A regeneração não precede a conversão e vice-versa”.
A crença calvinista que a regeneração precede a fé é largamente baseada nos dogmas calvinistas, que o homem está morto espiritualmente e assim, incapaz a exercitar fé a menos que seja regenerado por Deus primeiro.
Allen ofereceu uma evidência exegética extensiva contradizendo essa afirmação, mas a SBC Today oferece as seguintes palavras das notas de Allen, que ele relatou quase palavra por palavra na conferência.
Allen disse isso em referência a Efésios 2.1-10:

“Parte do que é conduzido da questão que a ‘regeneração precede a fé’ é de uma antropologia defeituosa, em parte de Efésios 2. Com respeito a Efésios 2.1-10, quando Paulo fala do não regenerado como estando ‘morto em pecados’ não existe nenhuma dúvida que ‘morto’ está sendo usado metaforicamente. Na Escritura ‘morto’ é usado com frequência metaforicamente para expressar alienação de Deus e ‘vida’ é usado para expressar união com Deus por meio da salvação (veja Aquino e O’Brien em Efésios, [Comentário Pillar]). Essa morte é ‘por conta de’ ou ‘com respeito a’ nossos pecados (note que o substantivo está no dativo e não há nenhuma proposição no texto grego). Muitos calvinistas sugerem que essa passagem ou 1) ensina abertamente a inabilidade humana (geralmente inabilidade moral) no sentido de ‘eles não podem porque eles não querem’, afirmando a distinção Edwardiana entre inabilidade natural e moral dos pecadores para responder ao evangelho; ou 2) implica em inabilidade humana para responder ao evangelho (John Eadie, Efésios, 121, argumentou que ‘morto’ implica inabilidade). Há outras figuras bíblicas do discurso usados para conotar depravação que não indica ou implica inabilidade total. Os calvinistas assumem que a definição deles de morte espiritual é correta e então sobrepõem isso com a palavra ‘morto’ em Efésios 2. Note no contexto mais amplo o motivo da separação em Efésios (2.12,13,19; 4.18). Note também a passagem paralela em Colossenses 2.12-13, onde Paulo afirma que embora as pessoas estão espiritualmente mortas, elas ainda podem exercitar a fé em Deus”.
Allen notou que a morte espiritual significa primariamente a separação de Deus, não uma inabilidade total para responder a Deus. Os calvinistas cometem um erro linguístico significante, empurrando a metáfora “morto” para além de seus limites metafóricos legítimos. Isso pode ser visto no uso de Paulo da metáfora “morto” como usado em Romanos 6.1-14 quando comparado com Efésios 2.
Também das notas de Allen:

“Segundo a Bíblia, os não salvos, que estão mortos espiritualmente, tem a habilidade para:
Agir segundo a consciência (Gn 3.7)
Ouvir a Deus (Gn 3.10-13)
Responder a Deus (Gn 3.10-13).
Adão e Eva morreram espiritualmente quando comeram o fruto.
Mas eles ainda eram capazes de ouvir e responder a Deus (Gn 3.10-13).
Se arrepender dos pecados (Lucas 15.18-19).
O filho pródigo, ainda em um estado de apatia (Lucas 15.32), ainda reconheceu os seus pecados e retornou ao pai.
Procurar a Deus (Atos 10.2).
Temer a Deus (Atos 10.2).
Orar a Deus (Atos 10.2).
Ambos, Nicodemus e Cornélio, estavam ‘procurando’ a Deus antes da regeneração deles.
Mas se eles estão mortos em seus pecados, como pode ser isso?
Conhecer a verdade sobre Deus (Romanos 1.18-20).
Perceber os atributos invisíveis de Deus (Romanos 1.18-20).

De novo, se eles estão mortos espiritualmente em um sentido de inabilidade total, como pode ser isso?
Alguns calvinistas destacam que em Efésios 2, a palavra “fé” não ocorre até o verso 8, mas, primeiro a palavra de Deus “nos faz livres” é mencionado no verso 5. Por isso a regeneração precede a fé. Não tão rápido!
2 problemas:

1 – Pergunte a si mesmo, “a referência a fé no verso 8 segue a atividade do verso 5? A fé segue do nosso sentar nos lugares celestiais no verso 6? A fé segue da nossa futura glorificação no verso 7? Claro que não.
2 – Além do mais, deve-se tomar nota do tempo perfeito no verso 5 e seu contexto. Paulo está falando de uma questão mais ampla do que a regeneração. Ele está falando sobre a salvação que inclui a regeneração e a conversão. Se a regeneração é uma parte da salvação, e ela é, e se a fé precede a salvação, e ela precede, então a fé também precede a regeneração. Simplesmente não se pode "separar um do outro" sobre isso em Efésios 2.1-10.
É interessante o que o próprio João Calvino disse sobre esse texto:

“[Paulo] não quer dizer que a fé é um presente de Deus, mas que a salvação é dada a nós por Deus, ou, que nós a obtemos pelo dom de Deus”.

O grande estudioso do Grego A.T. Robertson destacou que no Grego de Efésios 2.8-9, a graça é a parte de Deus e a fé é a nossa parte. O antecedente “isso” não é “fé” ou “Graça”, mas é o ato inteiro de ser salvo pela graça condicionada pela fé de nossa parte (Word Pictures).

1 – A capacidade de Fé significa que se pode fazer o contrário do que crê.
2 – Ninguém pode exercer fé salvífica de sua própria parte à parte da graça que possibilita.
3 – Acusar os não calvinistas de crer o contrário é um espantalho.
4 – A questão é se Deus escolheu criar soberanamente a humanidade com a habilidade de exercer fé e se Deus restaura essa habilidade pela graça capacitadora por meio do Santo Espírito e da Palavra de Deus à parte da regeneração seletiva.
Uma “causa principal” é uma causa eficiente que produz um efeito por virtude de seu próprio poder. Uma causa “instrumental” é uma causa eficiente que produz um efeito por virtude do poder de outra causa.
Na salvação, a graça é a causa principal e a fé é a causa instrumental. Considere esse silogismo com respeito a Efésios 2.8-9:

1 – “Por meio da fé” é a causa instrumental de “vivificados”.
2 – A Causa instrumental necessariamente precede seu efeito – “vivificados”.
3 – Fé precede a regeneração.

O único lugar onde o efeito pode preceder sua causa é em Jornada nas Estrelas.
A apresentação de Allen usou numerosas referências Escriturísticas e Históricas contradizendo de uma maneira erudita e compreensível que a regeneração não precede a fé. Considerando que nós lutamos para não postar suas notas na totalidade, deixamos vocês com essas considerações finais do Dr. Allen:

“Spurgeon disse: ‘O Arminianismo casa Cristo com uma noiva que Ele não escolheu’. Eu digo que o calvinismo casa Cristo com uma noiva em um casamento forçado, onde ela não tem a opção de recusar a sua proposta” [com respeito a regeneração e a fé que supostamente segue, desde que ninguém que é regenerado pode recusar exercer fé no esquema calvinista].

Como Ken Keathley destacou: a chamada de Deus pode não ser irresistível, mas ela é inevitável, segundo Atos 17.30-31. (“The Doctrine of Salvation”, A Theology for the Church).

CONCLUSÃO:

1 – Não há nenhum texto bíblico que conecta a fé e a regeneração em uma estrutura gramatical que prescreve uma ordem que apóia que a regeneração precede a fé.
2 – Não há nenhuma declaração na Escritura que impede que a fé preceda a regeneração.
3 – Há muitos textos bíblicos ligando a fé e a regeneração que apóia a fé precedendo a regeneração.
4 – Existem textos que parecem impedir a possibilidade da regeneração precedendo a fé. (Veja a tese de mestrado de Timothy Nichols, “Dead Man’s Faith: Spiritual Death, Faith, and Regeneration in Ephesians 2.1-10”, 2004).

O calvinista moderado Bruce Demarest disse: ‘a fé não parece ser um efeito da regeneração. Textos bíblicos claros sugerem que o ato de fé precede logicamente a regeneração. João 1.12-13 – receber Cristo por fé resulta em novo nascimento. João 7.37-39 – a fé precede o dom do Espírito no poder regenerativo. 1 João 5.1. A noção de que Deus regenera antes da resposta do pecador de fé penitente (cronologicamente ou logicamente) parece ser biblicamente injustificável’. (Bruce Demarest, The Cross and Salvation, 264-65).

Não existe nenhuma Escritura em nenhum lugar que diz diretamente que a regeneração precede a fé. Isso é uma dedução teológica que alguns calvinistas fazem impulsionada mais pelo sistema deles do que pela Escritura. A Escritura diz coisas como ‘Crê no Senhor Jesus Cristo e serás salvo’, como Paulo disse ao carcereiro de Fillipos em Atos 16.
Perceba a diferença sobre essa questão entre dois dos nossos primeiros teólogos calvinistas Southern Baptist:

JAMES P. BOYCE: Regeneração precede a fé. Logicamente o ato de habilitação de Deus deve, em uma criatura, preceder o ato da criatura, assim habilitada. Mas essa antecedência lógica envolve uma antecedência real, ou as melhores concepções de nossas mentes nos enganam e não são confiáveis. Pois essa antecedência lógica, apenas existe, porque a mente observa claramente uma dependência percebida da existência de um sobre o outro. Mas tais dependências demandam, se não causal, pelo menos uma existência antecedente. Aqui é só antecedente…não existe apenas antecedência, mas em alguns casos, um intervalo apreciável. Isso deve ser verdade sobre todas as crianças. Não há nenhuma razão porque não deve ser verdade para alguns pagãos. (Boyce, Abstract, 381).

JOHN L. DAGG: Fé é necessária para o caráter cristão e deve, portanto, preceder a regeneração, quando esta é entendida em seu sentido mais amplo. Mesmo em um sentido mais restrito, em que denota o começo da vida espiritual, fé, no sentido em que Tiago [2.17] usa o termo, pode preceder. Mas a fé que existe antes do início da vida espiritual, não pode ser uma fé viva. (Dagg, Manual of Theology, 277-ff.)

Aqui Boyce articula ambos, uma regeneração antecedente lógica e temporal, ao passo que Dagg, no máximo, articula alguma coisa de um entendimento simultâneo de fé e regeneração.
Eu darei a palavra final do Metodista Thomas Oden: “O amor e a graça de Deus são as cusas originárias da salvação. A morte expiatória de Cristo é a causa meritória. O Espírito de Deus é a causa eficiente. A Palavra de Deus é a causa instrumental. A fé é a causa condicional. A glória de Deus é a causa final. (Thomas Oden, Life in the Spirit, 3:118).
Soli Deo Gloria!”

Tradução Walson Sales




[1] Notas sobre a palestra do Dr. David A. Allen na Conferência João 3.16; notas preparadas e fornecidas pela equipe da SBC Today. <  http://sbctoday.wpengine.com/dr-david-allen-the-john-316-conference/  >

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