quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Um argumento a favor do livre-arbítrio

Gerald Harrison*

Para alguns filósofos, nossas decisões são livres apenas se forem sem causa. Para outros, a acusação é necessária para impedir que nossas decisões sejam descontroladas. Para alguns, a causação precisa ser indeterminística. Para outros, ela precisa ser determinista. Para outros ainda, nem uma coisa e nem outra importa.
No entanto, há uma concordância quase unânime de que o livre-arbítrio é necessário para estabelecer responsabilidade moral. Ou seja, o livre-arbítrio é necessário para nos fazer merecedores de louvor, censura, recompensa ou punição por nossos atos, e para que sejam válidas as chamadas “atitudes reativas”, como ressentimento, culpa e perdão.
Essa área comum entre contestantes fornece a base para um argumento positivo a favor do livre-arbítrio. Versões desse argumento (que não tem um nome específico) foram apresentadas por Thomas Reid, Randolph Clarke, Peter van Inwagen (Essay[1]) e Peter Strawson, entre outros.
Assim como é amplamente aceito que a responsabilidade moral exige livre-arbítrio, é também amplamente aceito que somos moralmente responsáveis por pelo menos parte do que fazemos durante parte do tempo. Para Reid, foi fundamental o princípio de que “alguns aspectos da conduta humana mereçam louvor e outros censura”[2]. Segundo Peter Strawson, o nosso compromisso com a responsabilidade moral é tão profundamente enraizado que é simplesmente inconcebível que possamos abrir mão dele, e assim a realidade da responsabilidade moral estabelece um condição-limite para onde pode levar um argumento racional.
Se nossa responsabilidade moral está além de qualquer dúvida razoável, então tem que estar além de qualquer dúvida razoável que temos livre-arbítrio, já que o primeiro pressupõe o último. Assim, temos o nosso argumento positivo a favor do livre-arbítrio.
Nem todo mundo aceita esse argumento. Uma minoria significativa de filósofos nega que sejamos moralmente responsáveis. Há, afinal, fortes argumentos a favor do livre-arbítrio ser incompatível com o determinismo e a favor de ele ser incompatível com o indeterminismo. Tais argumentos podem ser usados para levantar dúvidas sobre se temos livre-arbítrio, e assim para levantar dúvidas sobre responsabilidade moral.
Para maioria, no entanto, a crença de que somos moralmente responsáveis tem maior plausibilidade inicial do que qualquer uma das premissas de um argumento que leve à negação do livre-arbítrio. Assim, a responsabilidade moral fornece o melhor argumento positivo para pensar que temos livre-arbítrio.

Há, além dos mais, argumentos aparentemente irrefutáveis que, se forem corretos, demonstram que a existência de responsabilidade moral acarreta a existência de livre-arbítrio e, portanto, se o livre-arbítrio não existe, a responsabilidade moral também não existe. Mas é evidente que a responsabilidade moral existe: se não houvesse tal coisa como a responsabilidade moral, nada seria culpa de ninguém e é evidente que há estado de coisas para os quais podemos apontar e dizer corretamente para certas pessoas: é culpa sua.[3]


P1. Se somos moralmente responsáveis, então temos livre-arbítrio.
P2. Somos moralmente responsáveis.
  C1. Temos livre-arbítrio (modus ponens, P1, P2).



* HARRISON, Gerald, Os 100 argumentos mais importantes da filosofia ocidental, 1 ed, São Paulo: Cultrix, 2013,  pgs. 151-2; Geald Harrison, Ph.D., doutorou-se pela Universidade de Durham, no Reino Unido, em 2006. É professor de filosofia na Universidade deMassey, Nova Zelândia, e pesquisador honorário da Universidade de Alberdeen, no Reino Unido. Sua pesquisa se concentra em metafísica do livre-arbítrio, responsabilidade moral e ética da prociração.
[1] INWAGEN, Peter van, An Essay on Free Will. Oxford University Press, 1983.
[2] REID, Thomas, Essay on the Active Powers of the Human Mind. Cambridge, MA: The MIT Press, 1969, p. 361.
[3] INWAGEN, Peter van, “How to Think about the Problem of Free Will.” Journal of Ethics 12 (2008): 327-41.

2 comentários:

  1. Excelente reflexão!

    Só é possível ter responsabilidade moral se houver livre-arbítrio.

    Nós temos responsabilidade moral,

    Portanto, temos livre-arbítrio.
    ___________________________________

    Só pode haver punição ou recompensa se houver responsabilidade moral;

    Só há responsabilidade moral se houver livre-arbítrio;

    A bíblia afirma que haverá punição ou recompensas;

    Logo, há livre-arbítrio.

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  2. Se a predestinação ofende a bondade de Deus, a sua natureza justa, e anula toda a escritura, somos todos fantoches de um Deus que não nos ama. Eu acredito que já esta pré destinado a salvação quem crer, e quem não crê a perdição. O nosso Deus não amou alguns, amou o mundo inteiro.

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